02/11/2015

A emoção da colheita, a nova safra e Pablo Neruda

Pelo quarto ano consecutivo, venho à região da Andaluzia e de Portugal acompanhar a colheita e a produção anual dos extra virgens de excelência.  Entre o mês de outubro e até o fim de novembro, no hemisfério norte, obtém-se os campeões em diversidade e complexidade sensorial.  O mais interessante dessa rica experiência é que a cada ano, características muito distintas se apresentam, sempre relacionadas a fatores climáticos e a forma de elaboração.  

Testemunhar e realizar a colheita, acompanhar a chegada das azeitonas às áreas de recepção do lagar, seu processo de limpeza, moagem, batido, centrifugação, decantação e filtragem é como participar da composição de uma sinfonia, cujas notas só serão ouvidas quando a integridade da obra estiver realizada, sem chances de ser refeita.  A elaboração por lotes permitirá a correção através de notas graves ou agudas, com maiores ou menores pausas, acordes que serão combinados de forma a encontrar a harmonia perfeita.  Poucas horas após o desprendimento da oliveira, a azeitona já concedeu seu sumo e com benevolência nos oferece a tradução dos caprichos da natureza combinados aos esforços humanos para se obter o máximo da perfeição.  O momento da degustação é o mais aguardado e para os que não obtiveram o que desejavam, Salvador Dali dá a grande lição com sua frase:  "Não tenhas medo da perfeição, nunca a alcançarás." 

O mais intrigante desse mundo olivareiro, além de sua complexidade, é que os parâmetros que caracterizam a tão procurada qualidade foram modificados nos últimos anos graças às pesquisas científicas que os relacionam à valores nutricionais que fazem deste alimento o mais rico e completo que podemos obter da natureza.  Cada atributo positivo percebido organolepticamente está ligado a compostos voláteis que indicam sua qualidade, riqueza e pureza.   

O fato é que, verde ou maduro, notas herbáceas, frutais e inúmeras outras compõem sinfonias que encantam a quem as percebe e, combinadas com os mais distintos alimentos, aumentam sua biodisponibilidade, enriquecem nossa vida e nos falam à alma como Pablo Neruda tão bem soube homenagear em sua Ode ao Azeite:

"A oliveira
De volume prateado,
Severa e suas linhas,
Em seu torcido coração terrestre:
As graciosas azeitonas
Polidas pelos dedos que fizeram
A pomba e o caracol marinho:
Verdes, inumeráveis,
Puríssimos mamilos da natureza,
E ali nos secos olivais
De onde tão somente o céu azul com cigarras,
E terra dura existem,
Alí o prodígio,
A cápsula perfeita da oliva
Preenchendo com suas constelações as folhagens,
Mais tarde as vasilhas, o milagre,
O Azeite."

Um brinde azeitado!  Se as graciosas azeitonas foram polidas pelos dedos de Deus, coube ao homem extrair sua essência para a bem aventurança de todos!

 A colheita

 De frutos perfeitos

 O azeite perfeito

E sua degustação

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