Os
procedimentos para a obtenção do azeite foram introduzidos na Espanha durante a
dominação marítima dos fenícios em torno de 1.050 a.C e alcançaram notável
desenvolvimento com o domínio de Roma (45 a.C).
Na
ocupação árabe, o cultivo de outras variedades no sul do país influenciou na
difusão da cultura, a tal ponto que muitos vocábulos castelhanos, como aceite
(zeit) e aceituna tem raízes árabes e hoje a região é a maior produtora do
mundo.
A
produção do azeite de oliva está concentrada majoritariamente nos países
mediterrâneos, onde se encontram 99% das áreas cultivadas. A Espanha participa com aproximadamente 50%
deste total - segundo últimos dados do COI (Conselho Oleícola Internacional), a
produção de azeites espanhóis no ano passado foi de aproximadamente 1.400.000
toneladas, sendo a Andaluzia responsável
por 1.160.000 t, ou 80% da produção nacional.
O
cultivo da oliveira é predominante nesta região, onde a paisagem, a cultura e a
economia são evidentemente marcadas pelo setor, extremamente dependente do
fator climatológico e dos ciclos biológicos da planta, que alterna anos de
grandes colheitas e outras muito escassas.
No entanto, o emprego da tecnologia nos sistemas de cultivo e obtenção
do azeite tem permitido um constante crescimento na produção média anual.
De
agricultura intensiva, é evidente que a política local visa a quantidade em
detrimento da qualidade e toda a infraestrutura de produção está absolutamente
voltada para estes objetivos.
Estudando
os dados que constam no site do COI e as notícias mensalmente distribuídas em
seus informativos, procuro entender os movimentos que regulam os preços
internacionais e, embora essas análises não sejam o meu forte, fica claro que as
grandes indústrias ditam as regras regulando estoques com as coniventes
políticas públicas européias e os pequenos produtores são obrigados a obedecer a
esses drásticos mecanismos, vendendo suas produções ou fechando as portas. Nessa política, obviamente, a qualidade com
as percepções sensoriais e as riquezas nutricionais a ela relacionadas são pouco
levadas em consideração.
Como
Ecochef do Instituto Maniva e membro do Slow Food Internacional sei
perfeitamente que isso não é uma novidade e que esse movimento não se resume ao
setor oleícola, mas nada mais desafiador do que mergulhar em uma cultura tão
fascinante, conhecer seus pormenores e unir forças pela preservação de ricos e
inigualáveis valores. Na produção e cultivo tais valores são considerados detalhes
intrínsecos à sabedoria de uma planta milenar que extrai da terra sumos que
traduzem uma herança ancestral deixada por deuses, tão bem contada pela
mitologia e com significados até mesmo religiosos. Nos aromas e sabores dos verdadeiros extra
virgens, creiam, encontra-se esta tradução.
Meu
encontro com a Dra. Brígida Jimenez Herrera no ano passado em uma apresentação
no Instituto Cervantes do Rio de Janeiro foi fundamental para a compreensão
deste panorama. Minha mestra é doutora
em Farmácia pela Universidade de Granada, diretora do IFAPA (Instituto de Investigación e Formación
Agraria e Pesquera) da Andaluzia, pesquisadora, jurada de inúmeros prêmios
internacionais e é considerada uma das maiores experts em degustação de azeites
da Espanha.
A
seu convite participei em maio deste ano de um curso de degustação nesta
renomada instituição e sob sua orientação retornei para acompanhar a colheita e
produção na região, além de participar do 2º Congresso Internacional de Análise
Sensorial que acontecerá nos próximos dias 26 e 27 de novembro em Priego de
Córdoba.
Hospedado
no alojamento estudantil deste Instituto, cercado de olivais por todos os
lados, vivo desde que cheguei no último dia 16 com uma intensidade absoluta, sorvendo
informações bibliográficas e testemunhando um cotidiano fascinante com inúmeras
seções de degustações dos novos azeites que estão saindo dos moinhos,
mergulhando em um mundo sensorial incomparável, que se inicia ao tocar os
frutos para colhê-los em oliveiras muitas vezes centenárias, deitando-me em
suas sombras para ouvir suas raízes.
Ao
conhecer as entranhas dos institutos de pesquisas e estudo em toda a região,
assim como os novos modos de produção e colheita, percebe-se que o momento na
Espanha é de forte investimento na modernização tecnológica com o objetivo de
melhorar os níveis de qualidade dos produtos, criando associações e
certificações como elementos necessários para a diferenciação.
Além
disso, a grave crise econômica parece gerar reflexões que levam à cooperação e
ao pensamento sobre uma reinvenção do sistema atual como um todo. Hoje há bastiões de resistência pela
preservação desde olivais silvestres com suas diferentes espécies àqueles, cuja
produção não é tão lucrativa, mas que possuem valores históricos e humanos que
não podem ser medidos financeiramente.
São
mais de 256 variedades catalogadas em todo o país, todas com suas
peculiaridades que variam de acordo com o solo, clima, modo de cultivo e produção,
fatores que influenciam diretamente na composição química do fruto e
consequentemente nos parâmetros sensoriais do azeite. Entre tantas, podemos destacar as principais
e mais conhecidas, cujas características tornaram-se referências para as
degustações: Arbequina, Picual,
Hojiblanca, Picudo, Cornicabra, Manzanilla, cada uma com atributos distintos
que se diferenciam em suas intensidades de amargor, frutado e picor.
É
um mundo fascinante que se revela para nós brasileiros...
Azeites
de oliva, produto do refino químico, misturados e sem sabores, tradicionalmente
presentes em nossas prateleiras sempre terão seu lugar no mercado, mas as
opções que agora temos à disposição apresentam possibilidades infinitas de uso
e harmonização, além de muito enriquecer nutricionalmente nossa dieta.
Como
insisto em dizer, o caminho está aberto... seja produzindo nossos próprios
azeites ou importando-os, devemos conhecê-los para fazermos nossas escolhas
corretamente.
Se
o momento é favorável, pois somos um novo mercado, que venham todos, com
qualidade, pois finalmente estamos aprendendo a saber o que é bom neste vasto e
particular mundo.
Bibliografia: Jimenez, Brígida - Tesis Finalis
Bibliografia: Jimenez, Brígida - Tesis Finalis
A colheita mecanizada
A análise sensorial
Minha mestra, Brígida Jimenez e seu marido no almoço da entrega do prêmio Nuñes de Prado
Baena - 25.11.2012