Em todos os jornais e redes sociais desta semana só se
fala nisso, um alarde estranho e exagerado para uma notícias para lá de
velha.
Pelo conteúdo das matérias, a Proteste, associação de
defesa do consumidor, cumprindo seu papel, recolheu amostras de 19 marcas de
azeite rotuladas como extra virgem em supermercados do Rio e de São Paulo e os
submeteu a testes químicos e sensoriais. Os resultados não foram uma
surpresa para quem está antenado com as tendências de consumo desse ancestral alimento.
Já em 2009, o escritor norte americano Tom Mueller
lançou seu livro Extra Virgindade (vide artigo neste blog postado em
2010), traduzido pela editora Tapioca, no qual denuncia todas as ilegalidades
que permeiam o comércio de azeites de oliva em todo mundo. Um importante
alimento, que se tornou uma comoditie como tantos outros, e serve a
especulações de preços, onde poucos ficam milionários em detrimento do trabalho
de muitos. O mestre Carlo Petrini há décadas afirma que a origem do
alimento, sua produção e distribuição estão em cheque e quando supostas fraudes
vem à tona podemos deduzir que são apenas um pequeno sintoma desse complexo e
intrigante mundo, tão combatido pelo movimento SLOW FOOD. Mas voltemos ao
Brasil, à Proteste e as matérias dos jornais: dos 19 extra virgens testados, 4
foram considerados lampantes e vale aqui uma correção às nomenclaturas
utilizadas nas matérias e artigos: azeite lampante não é uma mistura de
óleos, é uma das classificações do azeite de oliva que não está dentro de parâmetros
químicos que o adequam à alimentação humana, daí o nome LAMPANTE dado na
antiguidade, pois servia para iluminar. Quando se detecta a mistura de
azeite de oliva com qualquer outra gordura vegetal ou mais de uma, torna-se um
óleo composto, o que configura de fato uma fraude. Sobre as 7 marcas que
foram consideradas apenas Virgens nos testes, acho estranho e um
tanto irresponsável divulgar e colocar cartazes acusando as marcas de fraude,
sem antes informar sobre o lote, local de apreensão e a condição de conservação
do produto, pois TODO Extra Virgem torna-se Virgem se for exposto a luz e calor
por determinado tempo (a temperatura ideal de conservação é entre 16º e 18º C).
Azeites Extra Virgens são perecíveis, alguns são mais estáveis que outros
dependendo do percentual de ácido oléico e de anti oxidantes. Eles não
envelhecem como vinhos e devem ser consumidos o mais fresco possível. Em
nosso país tropical, onde há poucas informações para toda a cadeia de
distribuição, nas condições que esses produtos são transportados, ficam
estocados e são expostos a venda, qualquer excelente Extra Virgem pode se
tornar Virgem dependendo de todos esse fatores. Não saio em defesa de
nenhuma das marcas, mas em minha convivência mais estreita com o estudo e
a produção, pude entender melhor as questões da comercialização das grandes
marcas industriais e dos Extra Virgens de excelência PREMIUM. São mundos
distintos, porém indissolúveis.
"A qualidade de um produto pode ser definida como
o conjunto de características próprias que permitem apreciá-lo como igual,
melhor ou pior que os restantes de sua espécie". (Carpio e Jimenez, 1993).
Já a qualidade
regulamentada para azeites de oliva foi estabelecida pelo COI (CONSELHO
OLEÍCOLA INTERNACIONAL - www.internationaloliveoil.org)
em 1991 e modificada em julho de 2008. No regulamento está
determinado que quando em um azeite de oliva virgem, um dos parâmetros
físico-químicos ou sensoriais não cumpre a norma, este passa a categoria
seguinte. Há um índice global de qualidade que é definido da seguinte
forma:
IC = 2,71 + 0,91 X PO - 0,81 X IA - 9,09 X K270 -
0,025 X IP, onde: IC = Indice de Qualidade; PO = Pontuação Organoléptica, norma
COI (panels de degustação); IA = Indice de Acidez; K270 = Absorção ao
ultravioleta a 270 nm; IP = Índice de Peróxido.
Minha mestra Brígida Jimenez diz em sua tese: "Este
índice permite classificar os azeites de uma forma contínua e mais eficaz.
Não obstante, temos que avançar mais introduzindo outros parâmetros, como
a estabilidade, que poderia prever o comportamento do azeite na etapa de
comercialização". Com tanta complexidade nos métodos de
classificação, as ações em andamento são estranhamente exageradas. Se não
há manipulação, há desconhecimento! Ainda que, pela legislação, o fabricante
tem o dever de garantir a integridade físico-química do produto até a data de
sua validade, sabemos que a desinformação é muito maior que a suposta intenção
das ações. Portanto, não é de hoje que ser VIRGEM não é fraude!
Temos muito o que aprender... Vivemos um grande
momento de transição e transformação no consumo do azeite de oliva em todo o
mundo, não só no Brasil. Extra virgens de excelência hoje não são apenas
extraídos, são elaborados. O cultivo, momento de maturação, variedade,
clima, otimização da colheita, transporte, tecnologia, tempo de batido,
temperatura, decantação, filtragem, armazenagem, todos são fatores que
contribuem para características sensoriais distintas, umas controladas, outras
mistérios da natureza.
Bons azeites, portanto, não podem ser baratos!Para
serem baratos, são menos estáveis e mais sujeitos ainda às variações
físico-químicas. Ao se tornarem virgens, não possuem mais o mesmo valor
nutricional, pois estão mais oxidados, mas nem de longe poderão prejudicar à
saúde (há azeites que são elaborados propositalmente nesta classificacão) e,
portanto, não há motivos para as ações passionais que estamos testemunhando.
Cabe, a quem interessar possa, informar-se melhor
sobre esse rico alimento funcional e entender que seu valor está diretamente
ligado à sua riqueza nutricional e suas nuances sensoriais, incomparáveis a
qualquer outra gordura vegetal. Azeite Extra Virgem é qualidade, estilo
de vida ! O único caminho é educar para conhecê-lo sensorialmente, descobrir
os atributos que caracterizam sua qualidade e fazer sua própria escolha.
Como em tudo na vida!
Olá Marcelo,
ResponderExcluirHá tempos que ouço falar sobre você.
Brilhante sua matéria! Completa e esclarecedora.
Sou estudante de Nutrição e tenho um blog e fui ligeiramente bombardeado nas últimas semanas de perguntas sobre o azeite. Fiquei aliviado ao ler sua postagem por não ter cometido nenhum equívoco em minhas respostas.
Bacana o esclarecimento sobre a classificação lampante. Outra questão interessante que você aborda é a estabilidade e conservação do produto, fatores importantíssimo quando se trata de azeites.
Mais uma vez gostaria de parabenizá-lo pelo artigo.
Em tempo, gostaria de esclarecer uma dúvida: já que são as características fisico-químicas que determinam a classificação do azeite, características estas, diretamente relacionadas as azeitonas, como qualidade do solo, clima, seleção e integridade. Seria correto afirmar que em cada safra o azeite deveria apresentar uma nova classificação?
Obrigado.
Prezado Jefferson, obrigado pelo seus comentários. Estudo o assunto profundamente desde 2008 e me formei recentemente em Elaiotecnia para, como educador, levar esse conhecimento ao maior número de pessoas possível, pois o assunto é muito desconhecido, não só no Brasil, mas no mundo. Os fatores que influenciam a qualidade do azeite são muitos, além dos que você cita e a cada safra os azeites são submetidos a análises físico químicas e sensoriais que vão determinar sua nova classificação. Os azeites industriais que majoritariamente conhecemos são feitos de forma a que sua composição química esteja dentro dos parâmetros mínimos de classificação. Por esse motivo, podem, quando mal conservados, passarem de uma classificação a outra. Perdoe-me a demora na resposta. Não recebo avisos de comentários e vou observar mais proximamente. Forte abraço.
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